Sou dos que pensam que não cabe a um especialista determinar como uma sociedade deve se comportar frente a este ou àquele tema. Nosso dever é dar informações científicas e permitir que, em posse delas, a própria sociedade decida sobre seus caminhos.
Com a maconha, é isso que deve ocorrer. O especialista alerta que seu uso por jovens, comprovadamente, associa-se com posterior queda no rendimento escolar, experimentação de outras drogas, depressão e esquizofrenia. Ainda que jovens que usaram maconha mais do que 100 vezes na vida (ou seja, duas vezes por semana ao menos por um ano), ao chegarem aos 25 anos, terão menos diplomas universitários e estarão menos empregados que seus iguais não usuários.
Outro fato relevante é que maconha, na história natural de um dependente químico, é a segunda droga de experimentação, sendo a primeira o álcool; daí porque se diz que ambas são drogas de entrada para as demais. Igualmente, é de se destacar o fato de que quanto mais uma droga for oficial ou oficiosamente liberada, maior será seu consumo e os problemas decorrentes dele.
Perguntados sobre por que experimentaram maconha, os jovens respondem que por curiosidade e pressão do grupo. Já com os não experimentadores a resposta é que não experimentaram porque é proibido e faz mal.
Tais fatos estão muito bem documentados por uma plêiade de trabalhos científicos de todos os quadrantes. Em ciência, primeiro fazemos uma observação, depois usamos uma metodologia consistente para verificar se nossa observação procede; depois, ela é compartilhada por outros pesquisadores, até que se transforme num consenso.
Não é o caso desse trabalho, publicado há 11 anos pelo Dr. Dartiu Silveira, citado pelo jornalista Marcos Rolim. Sua amostra foi pequena, seu tempo de seguimento insuficiente, e as demais variáveis não neutralizadas. Tais imprevidências impossibilitaram que a comunidade científica compartilhasse das conclusões do autor e, decorridos todos esses anos, desconheço outro trabalho que tenha chegado aos mesmos resultados; e mais, tampouco tenho informação de que algum serviço de dependência química no mundo esteja se regendo por essa orientação terapêutica, de sugerir que uma porta de saída para o crack seja usar maconha. Aliás, no passado, cometia-se a ingenuidade de se achar que cachimbo ajudaria o tabagista a parar de fumar ou que calmantes, tipo diazepínicos, ajudariam alguém a parar de beber.
Portanto, a título de resumo, o uso de maconha por jovens é deletério, sua liberação aumentará o consumo e os problemas dele decorrentes. Em posse de tais informações, que a sociedade decida o que quer fazer. Até lá, o debate robusto e elegante ajudará; e que não se tome como atitude antiética lembrar fato verdadeiro e de conhecimento público.
Sérgio de Paula - Psiquiatra e psicanalista, coordenador da Unidade de Dependência Química do Hospital Mãe de Deus
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